Alegre e indómita,
Vieste e me abraçaste
Com tanto vigor
Penetraste-me a pele,
Sibilando segredos
De encontro ao meu rosto.
Querida menina de ternura tanta
Olhos de cristal e ébano,
Inquisidores, murmurantes
Corpo de criança,
Alma inigualável,
A vida num sopro,
Vitral inexorável!
Vem, menina de Inhaca
Corpo de criança,
Com as marcas doridas
Da imperfeição dos teus membros
Tua mão e pé disforme
Transmitem a pureza do teu sonho enorme.
Imperfeitos? Deus meu!
Teus olhos profundosCantam perfeição
E teu doce lar,
Nessa espantosa intacta região,
Invade-me inteira
Derramando muros e fronteiras.
Menina de sabor rebelde
Fragâncias de pimenta e mel,Olhos aveludados,
Coração transbordante.
Tua pele trigueira sabe a mar e sal
Amendoim, cacau, caju.
Ardentes areias marmóreas
Éden de florestas sagradas
De palmeiras, tamareiras
E o azul das águas encantadas
Onde as musas vagueiam ao luar.
Conhecer-te e amar-te
Tão subitamente,
Tão insana e enlevadamente
Trouxe-me a frescura do sol poente
Enquanto teu sorriso irradiante
Previa o sonoro voltejar dos falcões.
Frémito divino,
Coração impoluto,
Flamejante encanto
Derramado em vaso de cristal.
E assim me sugaste
No largo da tua aldeia,
De piso de areia
E avassalador calor
Junto ao tanque onde senhoras zelosas
De sabão em riste,
Retiravam das vestes os traços do suor.
E nos despojos de uma antiga carroça
Ainda sobre mim repousas o teu olhar vibrante,Criança mansa e imaculada,
Tua nobre e simples vila,
Dirigida por respeitados anciões
Guardiães da ancestral sabedoria,
Atordoou-me,
Enfeitiçou-me
E despertou todo o meu alento.
Esvaziaste-me os poros
Mudaste-me a forma
Para caberes inteira
No espaço do meu vulto.
E agora, menina de Inhaca,
Menina concreta e vitoriosaEstás sempre comigo,
Mesmo juntinho ao meu coração
Como terra seca e lavrada.
Sinto-te ao meu lado
Sobrevoando o Índico
E aterrando em Lisboa.
E na aridez dos dias sem sentido
És o contraponto aos discursos insípidos,A dádiva que Deus tinha para mim!
Neste universo de premissas falsas
Foi a tua força que me vitalizou
E a tua doçura o que me salvou.
Ana Redondo, Junho 2013
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